Plano de Fuga
Carioca é quem decide ser
30/12/2016
O jornalista paulista Rica Perrone traçou há alguns anos em seu blog um perfil do que, na opinião dele, é ser carioca. Isso aconteceu um ano após ter vindo morar no Rio de Janeiro. O texto é maravilhoso e retrata com perfeição e emoção o espírito do carioca. Ainda mais que, rivalidades à parte, foi escrito por um paulista!
Segundo ele, “Cariocas não marcam encontro. Simplesmente se encontram”. Essa frase me inspirou escrever este texto porque ser carioca é como ter um encontro. Ninguém nasce carioca, decide ser. E para isso, não tem tempo nem hora marcada. Até porque, marcar hora com carioca é o mesmo que dizer “lá pelas... horas”. Dizer que vai não tem nenhuma garantia se vai chegar, porque carioca muda de opinião, de atitude, de vontade. Se quer faz, se não quer, tudo bem.
Cariocas se encontram o tempo todo porque vivem na rua. Conhecem alguém agora e em poucas horas são amigos inseparáveis. Compartilham segredos na areia da praia, entre um mergulho e outro e, se bobear, nunca mais se encontram. Isso acontece porque o carioca é espontâneo, natural, meio ingênuo, sem perder o ar de malandro.
Não pergunte ao carioca onde ele mora, porque ele não tem endereço. Pode ser em Ipanema, Copacabana, Flamengo, Tijuca, Borel, Rocinha. Mas não se preocupe. Cariocas não marcam encontro em casa. Eles te convidam para rua. É na rua que o carioca é carioca de verdade. São capazes de ir à praia e a um evento à noite calçando as mesmas Havaianas, e ainda identificarem alguma sofisticação nisso. Como disse o Ancelmo Gois em sua coluna no O Globo: “carioca é se permitir”.
Toda conversa tem que começar com “porra” e terminar com “de repente”. Se pergunta pra ele se ele quer refrigerante ou suco, por exemplo, ele responde “pode ser”. Porque o carioca curte a viagem e as pessoas. O resto é qualquer coisa. Pode ser um quiosque na praia ou um restaurante no Village Mall. Ele sempre “se garante”, com seu sorriso meio arrogante.
Cariocas não sabem nada de geografia, embora conheçam muito bem onde moram. Mesmo com a Linha 4 do Metrô, a Barra da Tijuca é longe demais e Búzios é logo ali. Ele vai, só pra curtir a paisagem, o pôr do sol, sem se preocupar se vai conseguir voltar a tempo de trabalhar no dia seguinte. Eles podem estar em um bar e logo depois subindo a Serra, só porque um “pessoal maneiro” que conheceu convidou.
“Carioca tem vocação para ser feliz”, escreveu Rica. Isso nada tem a ver com as circunstâncias, se mora no morro ou no asfalto. Muito menos com a falência do Estado do Rio. Porque sempre vem a sexta-feira e o domingo pra fazer o carioca esquecer qualquer dificuldade.
Todo mundo pode ser carioca, basta morar algum tempo por aqui e aprender. Ser carioca é como aderir a uma marca, um estilo de vida; é como curtir um perfil no Facebook ou seguir alguém no Instagram. No entanto, a condição primordial para ser um carioca “legítimo” é fazer o máximo de amigos que conseguir. Porque quanto mais amigos mais cerveja, mais baladas, mais alegria e mais carioca você vai ser.
Leia na íntegra os textos de Rica Perrone e de Ancelmo Gois.
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